NÚCLEO DE GERENCIAMENTO DE PRECEDENTES E AÇÕES COLETIVAS

Comunicado

Sempre há o que se avançar no Judiciário, diz desembargador em encontro sobre recursos repetitivos

Segundo dados do Relatório Justiça, existem no Brasil quase 100 milhões de processos em trâmite no Judiciário. Na tentativa de tornar mais célere os julgamentos, a Justiça brasileira tem buscado criar mecanismos e iniciativas para uniformizar os processos, principalmente para lidar com as demandas repetitivas. Com isso, foram instituídas medidas como é o caso da criação dos Núcleos de Repercussão Geral e Recursos Repetitivos. Na entrevista a seguir o desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), Alexandre Câmara, fala um pouco mais sobre os motivos que levaram à criação destas alternativas; o que ainda precisa avançar nesse setor, a mudança cultural que necessita ser inserida no Judiciário brasileiro, entre outros. O desembargador Alexandre Câmara participou, na segunda-feira (18), do 1º Ciclo de Estudos sobre Repercussão Geral e Recursos Repetitivos, evento que está sendo realizado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), na sede da Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (Asmego), em Goiânia.


De que maneira os recursos repetitivos podem colaborar com os entraves que a Justiça encontra para atender a grande demanda dos jurisdicionados?

Nós temos um sistema de tribunais que funciona como uma espécie de pirâmides, com uma base muito larga, formada pelos juízes de primeiras instâncias. Acima deles, os tribunais de segundo grau, estaduais e federais e, no topo dessa pirâmide, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF). Só que o STJ e o STF recebem uma carga de trabalho enorme. E se percebeu que muitas dessas causas eram iguais, eram causas realmente repetitivas. Por isso, se construiu essa técnica para tentar melhorar o trabalho daqueles tribunais.

Houve avanços?
Sem dúvida. Por força dos julgamentos desses recursos repetitivos tem ocorrido uma maior uniformização de entendimentos nos tribunais de segundo grau e nos juízos de primeiro grau e, isso, de certa maneira, desestimula outros recursos para discutir o que já está resolvido.

O que ainda é preciso fazer a curto prazo?
Sempre há o que avançar no Judiciário. A gente nunca pode achar que chegou em um ponto que está maravilhoso, perfeito e que se melhorar estraga. Eu diria que, a curto prazo, o que a gente precisa, não é de mexidas na lei. Quanto a esse ponto, especificamente, a gente precisa de uma mudança cultural. De mostrar para o Brasil que as decisões do STJ e do STF, tomadas nesse tipo de julgamento, tem eficácia vinculante. E tem que vincular os juízes de primeiras instâncias e os tribunais de segundo grau.

Falta uma cultura de ação coletiva no Brasil?
Nós temos um sistema que funciona muito bem e que está incorporado à nossa cultura de processos coletivos, mas para certos tipos de causas. Aquelas que dizem respeito ao chamado Direitos Difusos e Coletivos. Proteção do meio ambiente, proteção do patrimônio cultural, patrimônio histórico, para isso funciona muito bem. Neste caso já está definitivamente incorporado à nossa realidade. O que não tem funcionado muito bem, e não tem como funcionar mesmo, é o processo coletivo para proteção dos chamados interesses individuais homogêneos. Neste caso, o processo coletivo falha, porque só consegue tratar daquilo que é comum a todos os interesses e não de questões que são individualizadas.

Qual seria um exemplo dessa situação?
Quando a gente pensa, por exemplo, em milhares de pessoas que compraram determinado veículo, de determinado modelo, que veio com defeito de fabricação sério. Cada um sofreu um dano diferente. Um o carro pegou fogo e foi perda total. Outro o carro só chamuscou um pouco. O outro tinha uma pessoa dentro que morreu. Enfim, cada caso é um caso. E aí você não tem como fugir de uma liquidação individual desse dano. Acaba fazendo com que o processo coletivo acabe não sendo tão coletivo assim.

De que forma a liberdade decisória do magistrado impacta na Justiça brasileira?
O que não pode existir é uma ideia de que em nome da liberdade decisória, os juízes ordinários de primeiro e segundo grau podem interpretar a lei como quiserem. O que a gente precisa compreender é que quando o STF diz qual é a interpretação correta da Constituição, ou quando o STF diz qual é a interpretação correta da lei federal, isso tem que ter uma autoridade sobre os outros juízes, de modo que os outros digam essa é a interpretação que estou vinculado. Esta é a interpretação que eu tenho de aplicar. É claro que o juiz tem liberdade na apreciação dos fatos, que o STJ e o STF não vão examinar. Ele tem liberdade no sentido de que cabe a ele verificar se o caso que ele está julgando é ou não é igual aquele caso anterior. Ele tem liberdade para decidir casos que ainda não ocorram entendimento consolidado. Mas já tendo entendimento consolidado, essa liberdade tem que ser reduzida de modo que se preservem interesses mais relevantes para a sociedade.
(Entrevista e texto: Fernando Dantas – Centro de Comunicação Social do TJGO/ Fotos: Wagner Soares)

Fonte: Tribunal de Justiça de Goiás


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